Desde maio, o governo da Argentina tem impedido a nomeação de um brasileiro para um cargo de liderança no Focem, fundo do Mercosul. A resistência reflete a desconfiança do da gestão do presidente Javier Milei em relação ao bloco e ao fundo, financiado por Brasil e Argentina, mas que beneficia principalmente Paraguai e Uruguai.
O Focem, estabelecido em 2004, visa a arrecadar US$ 100 milhões anuais para projetos de infraestrutura. Nos últimos 17 anos, mais de 50 projetos foram aprovados, totalizando aproximadamente US$ 996 milhões. Em maio, o Brasil indicou Luciano Wexell Severo, economista do Ministério do Planejamento, para o cargo de coordenador-executivo da Unidade Técnica do Focem.
Severo teria como função supervisionar e avaliar projetos financiados, além de coordenar as atividades das unidades técnicas nos países membros. Sua indicação recebeu apoio imediato do Uruguai e, posteriormente, do Paraguai. No entanto, a Argentina tem consistentemente se oposto à nomeação.
Durante uma reunião do Conselho de Administração do Focem, a delegação argentina justificou sua posição ao alegar que, desde 2007, a unidade opera sem um coordenador-executivo titular e que tentativas anteriores de nomeações não foram bem-sucedidas.
O governo Lula tem pressionado pela nomeação de Severo em reuniões ligadas ao Focem. Documentos analisados pelo jornal Folha de S.Paulo revelam que a Argentina mantém seus argumentos. O Ministério do Planejamento do Brasil afirmou que as negociações são lideradas pelo Itamaraty. “O Ministério do Planejamento aguarda as negociações conduzidas pela chancelaria brasileira”, informou.
Javier Milei encara o Mercosul com ceticismo. Antes de assumir a Presidência, ele prometeu retirar a Argentina do bloco, promessa que não se concretizou. Sua chanceler, Diana Mondino, atua para evitar medidas drásticas e manter a Argentina no grupo, mas Milei sinaliza que o tema não é prioridade.
Em julho, Milei optou por não comparecer à cúpula de chefes de Estado do Mercosul em Assunção, preferindo participar de uma conferência de conservadores em Balneário Camboriú, ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Para o governo brasileiro, a resistência à nomeação de Severo é desconfortável, especialmente depois da quitação de uma dívida de US$ 99 milhões com o Focem. Essa quitação permite que US$ 70 milhões sejam aplicados no Brasil, em projetos próximos à fronteira, beneficiando países vizinhos.
Como principal contribuinte do Mercosul, o Brasil financia 70% do Focem, a Argentina 27%, Uruguai 2% e Paraguai 1%. No entanto, os beneficiários recebem em ordem inversa: Paraguai 48%, Uruguai 32%, e Brasil e Argentina 10% cada um.